Victor
Venturi passou em 6 universidades, mas escolheu o Caltech para cursar
Engenharia Mecânica na Califórnia (EUA) (Foto: Victor Venturi/Arquivo
Pessoal)
O Instituto de Tecnologia da Califórnia, também conhecido como “Caltech”, foi eleito pelo quarto ano consecutivo
a melhor universidade do mundo,
de acordo com o ranking divulgado no início do mês pelo Times Higher
Education. O Caltech, que deixou para trás nomes famosos como Harvard,
Oxford, Stanford e Cambridge, tem cinco estudantes brasileiros
atualmente.
A instituição é uma verdadeira “pequena notável” no meio acadêmico,
contando com 2.181 alunos, sendo atualmente 977 de graduação e 1.204 de
pós-graduação (incluindo mestrado, doutorado e pós-doutorado). São
apenas três alunos para cada professor.
O Caltech recebeu 6.625 inscrições para o processo seletivo da turma de
2018, o que representa mais de três vezes o número de alunos em todo o
instituto. Dois dos cinco brasileiros que estudam na universidade
contaram ao
G1 como conseguiram uma vaga no Instituto,
os esforços para acompanhar a puxada rotina de estudos e as dicas para
quem deseja estudar no exterior.
"O pessoal aqui é bem competitivo. Mas, se nós não fôssemos
competitivos, não seríamos os primeiros do mundo", diz Victor Venturi,
de 19 anos, que considera o clima de disputa entre os alunos positivo
para fazer o diferencial do Caltech. "Nós somos pessoas competitivas,
mas numa ideia de competição saudável. A gente dá o melhor que a gente
consegue, e temos ciência do que estamos fazendo", explicou o jovem.
No segundo ano do curso de engenharia mecânica e presidente do clube de
xadrez do Caltech (ou 'a' Caltech, para alguns dos íntimos que preferem
usar o termo universidade a instituto), Victor Venturi revelou que seu
interesse pela área e o desejo de estudar fora começaram quando ainda
estava no 7º ano do ensino fundamental. Ele participou de competições na
área de exatas, nas quais conquistou 3 ouros e 3 bronzes na Olimpíada
Paulista de Matemática, e viu palestras sobre estudar fora do país, o
que serviu como motivação para se dedicar a processos seletivos
internacionais durante o ensino médio.
"Foram três anos de muito trabalho, muitos estudos, de sentar a bunda
na cadeira e ficar com ela ‘chata’ de tanto se preparar", brincou
Victor, durante a conversa, após o término de uma aula a respeito de
equações diferenciais.
Mesmo após passar em 1º lugar na Unicamp, ser aprovado na Escola
Politécnica da USP (onde chegou a iniciar o curso) e na UFSCar, além de
ser também admitido nas universidades de Columbia e Duke, nos EUA, e a
Universidade de Toronto, no Canadá, Victor escolheu estudar no pequeno
instituto na cidade de Pasadena, na Califórnia, principalmente pela
posição no ranking mundial e a oferta de bolsas. "A Caltech é um pouco
mais gentil quanto a bolsas, um pouco mais generosas do que as
universidades em geral", revelou o brasileiro.
No ensino médio, eu era um dos melhores da escola e, agora aqui, a
ideia de melhor aluno não existe, porque todos eram melhores alunos em
suas escolas, e todo mundo é incrivelmente esforçado e inteligente.
Então aqui a expressão melhor aluno não faz sentido"
Victor Venturi, aluno de engenharia
da Caltech
"Não sou nenhum gênio, sou apenas um aluno esforçado. E vou dizer: têm
bastante gênios aqui na Caltech, que conseguem levar uma vida realmente
tranquila, sem estudar tanto. Não são muitos, mas eu não sou um deles.
Tenho que ser bem esforçado, organizado, bem disciplinado", reiterou
Victor, que enxerga um modelo mais abrangente a respeito das mentes
brilhantes que estudam na universidade.
"É muito interessante que, por exemplo, no ensino fundamental, eu era o
melhor aluno da escola. No ensino médio, eu era um dos melhores da
escola e, agora aqui, a ideia de melhor aluno não existe, porque todos
eram melhores alunos em suas escolas, e todo mundo é incrivelmente
esforçado e inteligente. Então aqui a expressão melhor aluno não faz
sentido", destacou.
Rotina
'Se
nós não fôssemos competitivos, não seríamos os primeiros do mundo',
avaliou Victor Venturi (Foto: Victor Venturi/Arquivo Pessoal)
O ritual diário é o mesmo adotado por alunos na maioria das
universidades, mas até certo ponto - acordar, banho, café da manhã e
partir para a aula. Contudo, o término do período é somente uma
formalidade, já que, para acompanhar o ritmo do instituto, é preciso uma
dedicação em tempo integral - às vezes em ritmos nem tão saudáveis,
como noites de estudo em claro, ou "noitadas", como Victor gosta de
definir.
Como as tarefas, em forma de listas de exercícios, são bastante comuns e
contam como parte da nota, além das provas, é bastante comum que os
alunos se juntem para resolver os problemas, em um sistema chamado de
"Collaboration Policy", ou política de colaboração, em tradução livre.
Caltech fica na região de Los Angeles
"As listas são extremamente difíceis, em especial se comparadas com
outras universidades em geral. Juntamos um grupo de 5 a 10 amigos e
vamos na biblioteca ou no quarto de algum deles e passamos a noite
fazendo as listas e trabalhando nelas. É de fato muito difícil, mas, em
geral, é bastante divertido", destacou o estudante, revelando em tom de
modéstia que não se enquadra entre os "crânios" da instituição. O clima
de boa vizinhança do Instituto, no entanto, não abre espaço para "corpo
mole".
'Casa' pequena e boa fofoca
Prédio
do Centro Cahill de Astrociência e Astrofísica no campus do Caltech em
Pasadena, na Califórnia (EUA) (Foto: Tales Caldas/Arquivo Pessoal)
De acordo com a instituição, o campus do Instituto de Tecnologia da
Califórnia possui apenas 50 hectares (cerca de 500 metros quadrados), um
nanico em comparação aos 800 hectares da Cidade Universitária, em São
Paulo. Além de deixar os estudantes mais próximos e facilitar o contato
com os professores, que almoçam no refeitório comum e dedicam horas do
dia para receber os alunos, o clima mais intimista da instituição
facilita que a "boa fofoca" se espalhe rápido - não o clássico "quem
ficou com quem", mas sim a respeito de avanços científicos ocorridos
dentro do campus.
"Você fica sabendo de tudo que acontece no campus rapidinho. Se alguém
acabou de descobrir um novo composto químico que tem propriedades X e Y,
você vai saber no dia, porque tem um amigo que trabalha naquele
laboratório que o professor descobriu esse composto", exemplificou,
destacando que o tamanho reduzido também acaba tornando a universidade
menos burocrática.
Victor está se decidindo entre as áreas de nanotecnologia e robótica e
com planos de cair de cabeça no mundo acadêmico e conseguir um PhD nos
EUA - ainda que diga que cientistas, em geral, são "meio capengas, meio
pobrinhos". Ele afirmou que alunos que desejam estudar no exterior
precisam focar nos estudos desde cedo, buscando diferenciais e lembrando
da importância da interdisciplinaridade.
"Seja um bom aluno, top 5 do seu ano na escola. E não só um aluno que
estude, e que faça outras coisas que não seja sentar a bunda na cadeira.
As universidades americanas estão interessadas em pessoas que fazem
muitas coisas. Ser um aluno mente aberta", recomendou Victor,
sublinhando que, caso o destino seja a Califórnia, pode ser mais difícil
conviver com a comida muito apimentada do que com a saudade dos
parentes do Brasil.
Passar sem colar
O
brasileiro Tales Caldas escolheu o Caltech para realizar seu doutorado
na área de nanofotônica (Foto: Tales Caldas/Arquivo Pessoal)
O brasileiro Tales Caldas, Capitão Engenheiro da Força Aérea
Brasileira, de 34 anos, também escolheu a universidade californiana para
estudar. Ele faz doutorado na área de Nanofotônica (que estuda o
comportamento da luz em escala nanométrica), e pretende utilizar o
conhecimento adquirido no exterior para produzir um retorno acadêmico ao
Brasil, por meio do IEAv (Instituto de Estudos Avançados), organização
militar do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA),
onde trabalhava.
"No IEAv, eu trabalhava com pesquisa na área de sensores à fibra
óptica, e a ideia é fazermos com que o Brasil se torne tecnologicamente
independente de outros países nesta área", disse Caldas. "No
desenvolvimento desses sensores, um dos próximos passos para evoluir
tecnologicamente é tentarmos produzir circuitos óticos integrados dentro
do Brasil. Caltech tem grande experiência na área de micro e
nanofabricação, conhecimento necessário para a fabricação destes
circuitos."
Caldas, que mora com a esposa brasileira e os dois filhos, com 3 anos e
o segundo com 11 meses, este último nascido nos EUA, garantiu que
tentou encontrar pontos negativos na universidade, lamentando apenas a
falta de "calor humano" dos estudantes, característica brasileira em
falta no resto mundo, mas preferiu destacar os 33 prêmios Nobel obtidos
por acadêmicos do Caltech e o "Código de Honra" obedecido pelos
estudantes. "Aqui os alunos não 'colam' nas provas, não copiam listas de
exercícios, entre outros aspectos de conduta. Isso acaba moldando o
perfil dos alunos que aqui se formam, que tendem a ser profissionais
mais éticos e dedicados", contou.
Busto do físico Robert Andrews Millikan, o primeiro
dos 33 vencedores do Prêmio Nobel do Caltech
(Foto: Tales Caldas/Arquivo Pessoal)
Receita de sucesso
A partir da sua experiência no exterior, Tales afirma que, mesmo com os
acertos das instituições de ensino brasileiras, as universidades
americanas dão lições importantes sobre a postura que deve ser adotada
diante dos alunos, a valorização dos professores e o investimento em
estrutura, que acabam influenciando diretamente na qualidade da produção
científica da instituição.
"A faculdade tem que valorizar o aluno, mas ao mesmo tempo 'não passar a
mão na sua cabeça'. Em contrapartida, o aluno também tem que ser
cobrado como um adulto, e a universidade não deve permitir que
profissionais se formem com lacunas em sua formação. Os professores
também devem ser valorizados, e não simplesmente tratados como
funcionários de uma empresa. Provavelmente ali se encontra a maior
riqueza de uma universidade", enumerou. "Por último, investimento na
estrutura. Prédios novos sempre são um fator motivador. Equipamentos
modernos, manutenção das verbas para pesquisa são fatores que muitas
vezes definem o sucesso ou o fracasso de uma pesquisa."
Os brasileiros não escondem a responsabilidade de estudar na
instituição "tetracampeã do mundo". "Me veio à mente algumas vezes:
'caramba, eu ainda não acredito que eu consegui estar aqui'. O fato de
Caltech ter sido eleita a melhor do universidade do mundo só aumenta a
minha responsabilidade", comentou Tales Caldas, dizendo que o maior
prêmio, sem dúvida, será obter o diploma do instituto após defender sua
tese de doutorado. "É uma experiência ímpar. Ter a possibilidade de
estudar aqui e conhecer todas essas pessoas brilhantes que trabalham e
estudam aqui é fantástica", finalizou Victor Venturi.