Treinador do atacante em início promissor no futebol conta bastidores de convivência em 2009 pelo Alvinegro, dispara contra dirigentes e diz: "Vida dele está acabando"
Início de Jobson no Botafogo: melhor momento da carreira (Foto: Agência Estado)
Quem
leu as manchetes sobre Jóbson em 2009, quando ajudou a salvar o
Botafogo do rebaixamento e surgia como promessa no futebol nacional, não
imaginava como a trajetória do atleta iria se desenhar nos anos
seguintes. Após ser pego duas vezes no exame antidoping por uso de
cocaína, desperdiçar chances em clubes como Botafogo, Cruzeiro (com quem
chegou a assinar pré-contrato para atuar em 2010), Atlético-MG e Bahia,
perder espaço até em mercados alternativos do futebol nacional e
internacional e ser afastado do esporte por quatro anos pela Fifa, por
se recusar a fazer o controle antidopagem na Arábia Saudita, o martírio
do atacante ganhou mais um capítulo nesta quinta-feira, quando Jóbson foi detido. Ele é suspeito de ter estuprado quatro adolescentes no Pará.Mas o que fez a vida de um jogador promissor deixar o futebol e ganhar as páginas policiais e cair no ostracismo? Técnico de Jóbson no melhor momento da carreira do atacante, em 2009, Estevam Soares, relembrou bastidores daquele ano, lamentou mais um episódio negativo na vida do jogador e levantou uma questão muito discutida, mas pouco mexida no meio futebolístico: a formação.
O técnico, que recentemente assumiu o Tupi-MG para a disputa a Série B do Campeonato Brasileiro, disse que ficou sabendo da detenção de Jóbson na tarde desta quinta e ficou muito chateado com mais um problema envolvendo o jogador.
– Eu fiquei muito surpreso, soube pouco antes de vir para o treino. Me chocou muito, porque é um menino, é um "pretinho", como eu sempre chamei, com o qual eu tenho carinho muito grande. Vejo isso com muita tristeza – lamentou.
Treinador hoje comanda o Tupi-MG, na Série B do Brasileirão (Foto: Marina Proton)
Para o treinador, o caso de Jóbson serve de alerta para uma situação preocupante nos clubes: a formação. Isso porque, segundo ele, meninos deixam suas famílias cada vez mais cedo para tentarem a sorte no futebol. Estevam, que também foi jogador e conquistou títulos brasileiros por São Paulo, em 1977, e Sport, em 1987, destacou que antigamente, os atletas já eram retirados das famílias de forma precoce. O que só piorou com o passar dos anos. Mas de quem é a culpa? Para ele, os dirigentes são os maiores responsáveis.
– Acho que ele é uma vítima social, deste problema ligado ao jogador de futebol. Nós no Brasil já temos um problema social enorme. Imagina o jogador de futebol, que geralmente é uma classe mais simples, humilde. É o caso de nós do futebol até repensarmos e analisarmos como estamos criando os nossos jovens atletas. Ele é um retrato dos nossos atletas, desta falta de apoio para os mais pobres e os menos favorecidos. No futebol, não temos dirigentes capacitados, que ajam como dirigentes, que sejam educadores de jovens. Temos um monte de baba-ovos. E quanto mais tempo passa, pegamos os garotos dos pais mais cedo. Antes, pegavam alunos de 15 e 16 anos. Hoje, pegamos com 11, 12, e a criação segue a mesma, o paternalismo o mesmo. Se lá no início tivesse um dirigente ou um clube que o tivesse abraçado, ensinado, preparado para a vida profissional, talvez ele (Jóbson) não estaria nesta situação – opinou.
a aposta
Estevam Soares treinou Jobson no Botafogo
(Foto: Agência Globo)
Antes
da experiência no Botafogo, a relação entre os dois era apenas
profissional, de um técnico que observava equipes menores para encontrar
talentos baratos e contratá-los futuramente. Aconteceu que, em 2009,
quando Estevam ainda não havia assumido o Botafogo, o treinador assistiu
a alguns jogos do Brasiliense e um atacante chamou atenção. Aí foi só
assumir o Alvinegro, observar o elenco e pedir a contratação.(Foto: Agência Globo)
– A minha situação com ele no Botafogo foi muito sui generis. Eu tinha visto ele jogar pelo Brasiliense tempos antes de eu ir para o Botafogo. E me chamou atenção, aquele "pretinho", correndo pra lá, pra cá, pra lá, pra cá. Iam se encerrar as inscrições e precisávamos de um goleiro e de um atacante de beirada. O goleiro foi o Jéfferson, mas não tínhamos o atacante. Me veio o nome do Jóbson na cabeça. Ele já estava na Coreia, afastado por problemas por lá, mas ele veio. Quando ele chegou e fui buscar mais informações, foi uma coisa muito terrível. As informações eram as piores possíveis. Mas nós, o Maurício Assumpção (presidente do Botafogo) e o Anderson Barros (gerente de futebol) compramos a ideia. E ele foi um dos responsáveis por livrar o Botafogo do rebaixamento. Ele explodiu, deu um retorno que poucas vezes eu vi um jogador me dar, com velocidade, aquele drible, arremate, precisão. Até o dia do doping, nós o cercamos de toda a proteção que podíamos. Mas a própria vida o dragou e acho que praticamente está chegando ao final – detalhou.
Até o dia do doping, nós o cercamos de toda a proteção que podíamos. Mas
a própria vida o dragou e acho que praticamente está chegando ao final
Estevam Soares
– Tivemos muito cuidado com ele nos dois primeiros meses. Tinha um funcionário do Botafogo que ficava por conta dele, de levá-lo para o hotel, para buscá-lo. Trouxemos a mãe e a irmã dele do Pará, até ele se encaixar. No final, a gente foi surpreendido, na segunda, terça-feira depois do jogo final contra o Palmeiras, com a divulgação do doping (o segundo positivo do jogador, que foi flagrado pela primeira vez após uma vitória sobre o Coritiba, por uso de cocaína, no mês anterior). Coincidentemente, no intervalo contra o Palmeiras, ele estava com um comportamento muito estranho. Se a gente empatasse ou perdesse, cairia, então o clima no vestiário era muito tenso. E ele (Jóbson) estava completamente excitado, completamente mexido. Talvez fosse até o efeito da substância – comentou.
Depois da queda, Jóbson foi suspenso pelo STJD, mas voltou a ter oportunidades no Botafogo e no Atlético-MG, onde teve o contrato rescindido por indisciplina. Em 2012, Estevam voltou a trabalhar com Jóbson, no Barueri e disse que buscou o atleta para tentar recuperá-lo, mas não teve êxito. Durante a entrevista, Estevam Soares confessou ter se perguntado o que estava acontecendo na vida de seu ex-atacante, desde que tomou conhecimento dos problemas que já existiam na vida do jogador em 2009.
– A gente fez tudo que dava – encerrou.
Jobson foi preso no Pará suspeito de estuprar quatro adolescentes (Foto: Reprodução/Facebook/Jobson Leandro)
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